17 dezembro 2022

Dinossauros (Dinosauria)

Montagem demonstrando a diversidade de formas e tamanhos entre os dinossauros. Da esquerda para a direita, os gêneros Tyrannosaurus, Passerella (pardal-raposa) (primeiro detalhe), Velociraptor, Plateosaurus, Compsognathus, Confuciusornis (segundo detalhe), Muttaburrasaurus, Scelidosaurus, Stegosaurus, Futalognkosaurus, Eoraptor, Apatosaurus, Corvus (corvo) (terceiro detalhe), Oviraptor, Dilophosaurus, Archaeopteryx, Heterodontosaurus e Triceratops.
© Julius T. Csotonyi, 2014

    Dinossauros são um grupo de répteis arcossauros que pertencem ao clado Dinosauria. Eles surgiram no período Triássico, entre 243 e 233,23 milhões de anos atrás, e tornaram-se os vertebrados terrestres dominantes após a extinção do Triássico-Jurássico, há 201,3 milhões de anos. Seu domínio continuou através dos períodos Jurássico e Cretáceo, até serem dramaticamente afetados pela extinção K-Pg, há 66 milhões de anos. Apenas as aves, que atualmente são consideradas um grupo de dinossauros, sobreviveram ao episódio e persistem até os dias de hoje.
    Os dinossauros são um grupo diversificado nas perspectivas taxonômica, morfológica e ecológica. Considerando apenas as aves atuais, elas já são a classe de tetrápodes com o maior número de espécies vivas - mas falaremos melhor sobre elas em outro momento. Desde a era Mesozoica, os dinossauros estão presentes em todos os continentes (incluindo a Antártida), na forma de espécies herbívoras, carnívoras ou onívoras, bípedes ou quadrúpedes, gigantes ou pequenas.

Primeiras descobertas


    Fósseis de dinossauros são conhecidos há milênios, porém durante muito tempo sua verdadeira natureza não foi reconhecida. Assim, fomentaram o imaginário popular em diversas culturas: na China, formaram a imagem dos dragões; na Europa, inspiraram lendas de gigantes e outras criaturas mitológicas. As primeiras descrições científicas do que viriam a ser reconhecidos como ossos de dinossauros apareceram no final do século XVII, na Inglaterra. As primeiras espécies só foram identificadas no início do século XIX. Em 1842, o paleontólogo inglês Sir Richard Owen cunhou o termo Dinosauria para se referir ao conjunto de répteis distintos que estavam sendo descobertos em seu país. O nome deriva do grego antigo deinos, "terrível, poderoso", e sauros, "lagarto" ou "réptil", significando, portanto, "lagarto terrível". Owen pretendia evocar não só o aspecto assustador dos dentes e garras desses animais, mas também sua grandiosidade e magnificência.


O que define um dinossauro?


Cladograma simplificado do grupo Archosauria.
Crédito: Simon Powell / Brusatte et al., 2010

    Os dinossauros pertencem a um grupo de répteis chamados de arcossauros (Archosauria), que incluem também os pterossauros e os pseudossúquios (Pseudosuchia), este último contendo os crocodilianos modernos e uma infinidade de parentes extintos. Os arcossauros distinguem-se, entre outras coisas, por dentes serrilhados fixados em soquetes, algumas aberturas no crânio (fenestras anterorbitais, à frente das órbitas oculares, e fenestras mandibulares, na mandíbula) e uma protuberância (o quarto trocânter) na metade do fêmur, que oferecia uma grande superfície para ancorar músculos.
    Em geral, os dinossauros podem ser descritos como arcossauros que possuem os membros traseiros mantidos eretos abaixo do corpo. Sua postura é semelhante à da maioria dos mamíferos modernos, mas distinta daquela vista em grande parte dos outros répteis, cujos membros estendem-se para os lados. Essa inovação permitiu aos primeiros dinossauros respirar facilmente enquanto se locomoviam, gastar menos energia e, assim, tornarem-se mais ativos do que os répteis rastejantes. Os membros eretos provavelmente também ajudaram a suportar a evolução de corpos maiores, ao reduzir as tensões de flexão nos ossos dos membros.
     Ancestralmente bípedes, os primeiros dinossauros tinham as mãos livres para manipular vegetais ou agarrar presas. Eles rumaram para adaptações que valorizavam a velocidade - de fato, quase todas as características que definem um dinossauro estão relacionadas à locomoção. Posteriormente, muitos grupos desenvolveram quadrupedalismo, algumas espécies sendo até mesmo capazes de alternar entre as duas posturas.

As articulações do quadril dos dinossauros permitiam que eles andassem com os membros eretos, uma das razões para seu sucesso evolutivo.
Crédito: Fred the Oyster, 2014
Adaptado por: Felipe Bampi, 2022

    Embora as descobertas das últimas décadas tenham tornado mais difícil listar todas as características que distinguem os dinossauros, todos eles compartilham certas modificações do esqueleto arcossauro ancestral, ou claramente descendem de dinossauros mais antigos que possuem essas modificações. Alguns grupos mais tardios, inclusive, exibem versões ainda mais modificadas desses traços. Entre as características usadas para definir um dinossauro estão: encaixe do fêmur no quadril com uma abertura (acetábulo perfurado); ossos do tornozelo (calcâneo e astrágalo) mais acoplados aos ossos da perna (tíbia e fíbula); tornozelo que se dobra em um único plano, como uma dobradiça; mãos com o quarto e o quinto dedo reduzidos; pés com o quarto dedo também reduzido; três ou mais vértebras sacrais (da pelve); e, como já mencionado, membros mantidos diretamente sob o corpo. Além dessas, há também as fenestras anterorbitais e mandibulares, como nos demais arcossauros, e as fenestras temporais (atrás das órbitas oculares), como nos demais répteis diápsidos.

Na maioria dos répteis, a cabeça do fêmur encaixa-se em uma concavidade da pelve, chamada acetábulo. Nos dinossauros, porém, o acetábulo é totalmente perfurado, permitindo um melhor encaixe e possibilitando a postura ereta desses animais. Entretanto, alguns dinossauros primitivos, como o Saturnalia, ainda possuíam o acetábulo fechado. Na imagem, cintura pélvica de Tyrannosaurus (espécime "Stan"), exposto no Museu de História Natural da Universidade de Oxford, Reino Unido.
Crédito: Ballista, 2007
Adaptado por: Felipe Bampi, 2022

Classificação


    Em 1888, o paleontólogo britânico Harry Govier Seeley dividiu Dinosauria em dois grandes grupos, Saurischia e Ornithischia, baseados nas diferenças entre suas estruturas pélvicas (bacias). Os saurísquios (do grego "quadris de lagarto") retiveram a estrutura pélvica de seus ancestrais, com o osso púbico voltado para frente. Já os ornitísquios (do grego "quadris de ave") possuíam uma pelve superficialmente semelhante à das aves, em que o púbis apontava para trás. Entretanto, não foram estes que deram origem às aves, e sim os saurísquios. Na verdade, Seeley não propôs essa classificação de maneira a refletir relações evolutivas, apenas levou em conta características anatômicas. Os saurísquios modificaram a forma básica da pelve em muitos de seus subgrupos, rotacionando o púbis para trás em diferentes graus - isso pode ser visto, por exemplo, nos herrerassaurídeos, nos terizinossauroides, nos dromeossaurídeos e, por fim, nas aves.

Estrutura pélvica de saurísquios e ornitísquios, representados, respectivamente, por um Allosaurus e um Stegosaurus.
© Encyclopedia Britannica, Inc., 2014
Adaptado por: Felipe Bampi, 2022

    Seeley acreditava que os dois grupos que ele criou eram tão diferentes entre si que deviam ter origens distintas, e não foi até a década de 1980 que novas técnicas de análises cladísticas demonstraram que tanto saurísquios quanto ornitísquios realmente possuíam ancestrais comuns no Triássico.
    Os saurísquios, hoje definidos como todos os dinossauros que compartilham um ancestral comum mais recente com as aves do que com os ornitísquios, abrangem os sauropodomorfos (herbívoros de pescoço alongado) e os terópodes (dinossauros exclusivamente bípedes que incluem as aves). Por sua vez, os ornitísquios, que hoje são definidos como todos os dinossauros que compartilham um ancestral comum mais recente com o Triceratops do que com os saurísquios, englobam uma variedade de grupos primariamente herbívoros e com bico (estegossauros, anquilossauros, ornitópodes, ceratópsios, paquicefalossauros e outras linhagens menores).

Cladograma simplificado do grupo Dinosauria.
Crédito: Nobu Tamura, 2012

    Apesar de a classificação tradicional de Seeley ter sido amplamente aceita por mais de um século, um estudo de 2017 propôs uma mudança sem precedentes na árvore filogenética dos dinossauros, ao sugerir que os terópodes são mais próximos dos ornitísquios que dos saurópodes. Juntos, terópodes e ornitísquios formariam, então, o clado Ornithoscelida. Essa nova organização explicaria, por exemplo, como alguns ornitísquios tinham filamentos parecidos com penas, mesmo estando distantes das aves. Análises subsequentes, porém, concluíram que, estatisticamente, ambas as árvores filogenéticas são igualmente plausíveis. O problema surge da similaridade entre as espécies mais próximas da base da árvore, que dificulta a distinção entre os grupos. Portanto, a questão segue em aberto, a depender de descobertas futuras em relação aos dinossauros mais antigos.

Novo cladograma dos dinossauros segundo a hipótese de Matthew Baron e colegas (2017).
Crédito: Nobu Tamura, 2017

Origem e evolução


Os herrerassaurídeos, como o brasileiro Gnathovorax que viveu há 233 milhões de anos, foram um dos primeiros grupos de dinossauros a surgir. De classificação controversa, é possível que eles não fossem nem saurísquios, nem ornitísquios, mas uma linhagem à parte.
Crédito: Márcio L. Castro, 2022

    Os dinossauros divergiram de seus ancestrais arcossauros entre o Triássico Médio e o Superior, mas inicialmente não eram as criaturas terrestres dominantes. As poucas primeiras linhagens de dinossauros se diversificaram durante as idades Carniana e Noriana do Triássico Superior. No Jurássico, sua evolução seguiu as mudanças na vegetação e na localização dos continentes, até então unidos em uma única massa de terra, a Pangeia. Assim surgiu uma fauna global composta principalmente por carnívoros celofisoides e herbívoros sauropodomorfos. Essa distribuição homogênea continuou pelo Jurássico Médio e Superior, quando muitas localidades tinham estegossauros e grandes saurópodes como habitantes herbívoros, e ceratossauros, megalossauroides e alossauroides como predadores.

Fauna da Formação Morrison, no Colorado, EUA, há 150 milhões de anos, incluindo camptossauros, Stegosaurus e Diplodocus.
© Manuel Cohen
Fauna da Formação Tendaguru, na Tanzânia, incluindo Giraffatitan, Dicraeosaurus e Kentrosaurus, as contrapartes africanas dos mesmos grupos de dinossauros que habitavam diferentes regiões do mundo durante o Jurássico.
Crédito: James Kuether, 2015

    Anquilossauros e ornitópodes também estavam se tornando mais comuns, enquanto os sauropodomorfos primitivos se extinguiram. Outro evento evolutivo importante do Jurássico foi o aparecimento dos dinossauros avianos, descendentes de terópodes celurossauros manirraptores.

Archaeopteryx, um dos dinossauros avianos mais antigos de que se tem notícia, viveu há cerca de 150 milhões de anos, no Jurássico Superior da Europa.
Crédito: Franco Tempesta

    No Cretáceo Inferior, com a fragmentação dos supercontinentes Laurásia e Gonduana em andamento, os dinossauros já estavam demonstrando diferenças marcantes entre os continentes. Anquilossauros, ornitópodes iguanodontes e saurópodes braquiossaurídeos espalharam-se pela Europa, América do Norte e norte da África. Eles foram logo acompanhados ou substituídos na África por saurópodes titanossauros e rebaquissaurídeos, além de grandes terópodes espinossaurídeos e carcarodontossaurídeos, grupos também encontrados na América do Sul.

Paleoecossistema do início do Cretáceo Superior (Cenomaniano) da Formação Bahariya, no Egito. Um abelissaurídeo confronta o espinossaurídeo Spinosaurus (centro-esquerda, com o peixe Retodus na boca) e o carcarodontossaurídeo Carcharodontosaurus (centro), observados de longe por um grupo de titanossauros Paralititan (esquerda). Também presentes na imagem dois crocodilomorfos Stomatosuchus (canto inferior esquerdo), dois Bahariasaurus (fundo, à direita) e um bando de pterossauros no céu.
Crédito: Andrew McAfee, 2022

    Na Ásia, manirraptores como dromeossaurídeos, troodontídeos e ovirraptorossauros se tornaram os terópodes mais comuns, e anquilossauros e ceratópsios primitivos se tornaram herbívoros notáveis. A Austrália era lar de anquilossauros, hipsilofodontes e iguanodontes. Muitos grupos de dinossauros herbívoros desenvolveram maneiras mais sofisticadas de processar o alimento na boca, como as baterias dentárias de ceratópsios, iguanodontes e rebaquissaurídeos (Nigersaurus, por exemplo), que evoluíram independentemente em cada uma dessas linhagens.

As baterias dentárias presentes em alguns grupos de dinossauros (como o Triceratops) eram formadas por centenas de dentes aglomerados, que compunham uma eficiente superfície para triturar vegetação.
Crédito: (autor desconhecido)

    No Cretáceo Superior havia três faunas gerais de dinossauros. Na América do Norte e Ásia, os terópodes mais significativos eram os tiranossaurídeos e vários manirraptores, menores; entre os herbívoros predominavam ornitísquios como hadrossaurídeos, ceratopsídeos, anquilossauros e paquicefalossauros. Na Europa prevaleciam dromeossaurídeos, iguanodontes rabdodontídeos, anquilossauros nodossaurídeos e titanossauros. Nos continentes do Hemisfério Sul, que haviam formado a Gonduana (América do Sul, África, Antártida, Austrália e o subcontinente indiano), dominavam os terópodes abelissaurídeos e os titanossauros.

A Formação Huincul, na Argentina, data do início do Cretáceo Superior (idades Cenomaniana e Turoniana) e rendeu fósseis de vários dinossauros impressionantes. Da esquerda para a direita, o abelissaurídeo Skorpiovenator, o titanossauro Argentinosaurus, o rebaquissaurídeo Cathartesaura, o neovenatorídeo Gualicho, o titanossauro Choconsaurus, o noassaurídeo Huinculsaurus, o carcarodontossaurídeo Mapusaurus e o abelissaurídeo Ilokelesia.
Crédito: James Kuether, 2020
O ceratopsídeo Pentaceratops, o hadrossaurídeo Parasaurolophus cyrtocristatus e um tiranossaurídeo nas florestas subtropicais do Novo México, EUA, há 75 milhões de anos (idade Campaniana do Cretáceo Superior).
© Andrey Atuchin / Denver Museum of Nature & Science

    Apesar de toda essa diversidade, análises estatísticas têm demonstrado que, desde aproximadamente 100 milhões de anos atrás, os dinossauros em geral já apresentavam uma acentuada redução na capacidade de substituir espécies extintas por novas, tornando-os impossibilitados de responder rapidamente e de se recuperar de mudanças ambientais drásticas, como as que ocorreram ao final do Cretáceo.
    A extinção do Cretáceo-Paleógeno eliminou todos os grupos de dinossauros, à exceção das aves neornites, cujas linhagens sobreviventes (ancestrais das ratitas, galinhas, patos e uma variedade de aves aquáticas) rapidamente se diversificaram no início do período Paleógeno. Elas ocuparam os nichos ecológicos deixados vagos por dinossauros do Mesozoico, como os aviales enantiornites, arbóreos, e hesperornites, aquáticos, além dos grandes terópodes.

Fauna e flora da Formação Jiufotang, no noroeste da China, durante o Cretáceo Inferior, incluindo os aviales Sapeornis, Confuciusornis, Yanornis, Jeholornis, Sulcavis Longipteryx, além das plantas Baeira gracilis, Neozamites denticulatus, Acanthopteris gothani, uma ginkgoide, Nilssoniopteris, Equisetites longevaginatus, Podocarpites e Nageiopsis transbaikalia, o peixe Lycoptera, a salamandra Liaoxitriton, o mamífero Liaoconodon hui e o besouro Bilineariselater foveatus.
© Michael Rothman, 2015

6 comentários:

  1. Eu pensava que você já tinha feito essa postagem, excelente postagem Felipe

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    1. Por incrível que pareça, ainda não tinha feito! Até havia uma postagem antiga sobre dinossauros, que eu substituí por esta, mas ela não era tão detalhada assim. Como eu já falei bastante sobre dinossauros nos artigos da série "História da Terra" e também sobre os grupos de dinossauros em específico, deve ser por isso que ninguém nunca me pediu uma postagem assim, mas achei importante ter uma que explicasse os dinossauros em um contexto geral.
      Valeu, Leandro!

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  2. Com todo respeito, c4aralh0! Que postagem fod4! Velho, enquanto estava lendo me senti assistindo os vídeos do Pirulla sobre dinossauros, ficou muito bem detalhada e escrita. E a imagem do começo, muito show, dinossauros na sua mais pura essência, sejam eles aves ou não. Parabéns, Felipe, parabéns.

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    1. Muito obrigado, Vinícius! Eu usei um vídeo dele como referência, kkkk! E aquela imagem eu encontrei por acaso, antes mesmo de começar a escrever. Foi ela que me inspirou!

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  3. Felipe, faz uma postagem daquela nova proposta feita por Müller e Garcia de que os silessaurídeos teriam dado origem aos ornitísquios. Pois, sinceramente, isso não foi um artigo e sim um verdadeiro tijolo, uma porrada bem grande dentro da paleontologia.

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    1. Vou falar quando eu fizer um artigo sobre os ornitísquios, que estou planejando!

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